Texto elaborado por Jessica Machado e Juliana Furlanetto
A vila de São Vicente foi a primeira cidade fundada no Brasil, por volta de 1532 no litoral sul de São Paulo. Atualmente, 500 anos depois, São Vicente se enquadra como um dos municípios mais desfavorecidos do estado de São Paulo. De acordo com o último levantamento do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, realizado em 2010, a Região Metropolitana da Baixada Santista – RMBS, possui aproximadamente 300.000 (trezentos mil) pessoas habitando em aglomerados subnormais. Dentre as nove cidades da região, São Vicente é a segunda no ranking em ocupação de lugares periféricos, além de estar entre as 10 (dez) cidades do Brasil com maior número de moradias construídas sobre palafitas – uma produção do habitat construída em áreas alagadiças, mares, lagos, rios e mangues.
A ilha abrigou algumas das primeiras ocupações urbanas do Brasil e por isso sofre as consequências decorrentes da desconfiguração de seus cursos d’água e da ocupação irregular de suas áreas de nascentes.
Decorrente da falta de responsabilidade do Estado e em virtude dos movimentos migratórios do século XX, o território começa a sofrer os primeiros reflexos do mau planejamento socioespacial. Os aglomerados subnormais da comunidade da Vila Margarida, localizada na costa oeste da ilha, considerados quantitativos no déficit habitacional, são apenas alguns dos problemas levantados pelos arquitetos e urbanistas contratados através do edital – 006/2020 CAU/SP.
A comunidade México 70 e a Vila Margarida, são uma das cinco maiores comunidades integradas da América do Sul, hospedando aproximadamente 50 (cinquenta) mil habitantes.
São inúmeras as problemáticas encontradas nesse terreno, como áreas alagadiças, escassez de espaços públicos de qualidade – lazer, contemplação, interação social e permanência -, falta de infraestrutura em geral – iluminação, drenagem e saneamento, calçamento viário, tratamento de resíduos e outros -, resultando em uma área insalubre, com uma má adequação socioespacial, prejudicando a saúde ecossistêmica, a economia solidária, a captação de renda e produção do habitat digno.
Saberes ancestrais e ribeirinhos, ainda estão presentes na dinâmica de ocupação dos moradores das palafitas. A pesca é a principal fonte de abastecimento de renda para as famílias que resistem no território.
Curiosidade – Copa do mundo e a Vila Margarida/México 70
A copa do mundo, sediada no México em 1970, foi o impulso para “batizar” o bairro. O time do Brasil maravilhou toda população mundial com seu futebol naquele ano. Ao mesmo tempo, a comunidade nascia, e o nome México 70 foi uma forma carinhosa de homenagear a seleção brasileira.
As intervenções desenvolvimentistas da Ilha
O Instituto Procomum, com sede em Santos/SP, cuja missão é ativar e participar de redes onde o foco é promover a transformação social e um mundo comum entre diferentes, desde 2018 possui o GT ATHIS no LabProcomum – laboratório cidadão que oferece espaços de convívio e oficinas, e acolhe diferentes comunidades de criação e práticas. Esse GT ATHIS (Grupo de Trabalho – Assessoria Técnica em Habitações de Interesses Sociais), formado por arquitetas e urbanistas, busca desempenhar atividades que promovam caminhos para alcançar a melhoria qualitativa das habitações de baixa renda.
O Instituto Procomum e o Laboratório ATHIS na Baixada, têm a proposta de desenvolver projetos em parceria com o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Estado de São Paulo (CAU- SP). Além de ter promovido o Curso de Capacitação para Profissionais em ATHIS e Seminários de Mobilização já com parcerias de fomento do CAU/SP, o GT, após se inscrever para o edital 006/2020 e ser contemplado em 2021, selecionou 30 arquitetes de todo Brasil por meio de chamada pública, para participar de oficinas e mentorias. Esses profissionais, receberão uma bolsa auxílio a fim de oferecer em contrapartida, neste caso, um projeto arquitetônico ou urbanístico em co-criação com a população da Vila Margarida e México 70, para melhorias de suas habitações e do bairro.
O desenvolvimento deste projeto tem como base primordial a escuta aos moradores e suas frentes dominantes, acreditando que só assim será possível propor melhorias de acordo com a realidade e o desejo, e a necessidade da população local.
O que é ATHIS?
Lei de Assessoria Técnica em Habitações de Interesses Sociais
– Lei Federal n° 11.888/2008
A Lei de ATHIS garante que famílias com renda de até 3 (três) salários mínimos, assentadas em áreas urbanas e rurais, tenham acesso a assistência técnica pública e gratuita de profissionais habilitados, quando necessitarem de reformas, regularizações, ampliações e outros serviços.
Metodologia
A metodologia escolhida para a produção dos projetos arquitetônicos ou urbanísticos em co-criação com a população da Vila Margarida para melhorias de suas habitações e do bairro – em tempos de Pandemia (COVID-19) – , se deu através da elaboração do processo participativo, onde buscamos aproximação com as organizações coletivas que já atuam na área, mapeando os moradores mais colaborativos para a aproximação com a comunidade, a fim de estabelecer o processo de escuta tão desejável, com intuito de ouvir as experiências, vivências, os desejos e as dores de cada morador.
Todo processo está sendo realizado remotamente através de plataformas digitais, durante um período de 4 (quatro) meses. Após o processo de escuta e elaboração dos diagnósticos, se concretiza o plano de necessidades junto com a comunidade, que busca encontrar soluções para uma possível adequação sociotécnica do espaço, identificando famílias, locais e habitações de extrema urgência de intervenção.
Além do projeto arquitetônico e/ ou urbanístico, o principal objetivo deste projeto é inserir a população em políticas sociais, melhorar a qualidade de vida, conscientização e qualificação do espaço urbano que ocupam.
Colaborações e potencialidades
Apesar do contexto territorial que existe na Vila Margarida & México 70, é notório o sentimento de pertencimento que os moradores possuem, além do pensamento coletivo que a todo momento firmam nas reuniões.